terça-feira, 20 de agosto de 2013

Festival de Inverno de Amparo 2013: pintura da "Mudança Azul"

O Festival de Inverno de Amparo, desde sua concepção, foi idealizado como evento que preencheria o período de recesso escolar de modo que a população tenha oportunidade de curtir com a família e amigos atrações das quais não teria tão fácil acesso em outra oportunidade, seja por questão da distância, seja por questão financeira ou pura falta de oportunidade. Nasceu como um evento democrático, que não restringe condição financeira ou faixa etária, e ainda oferecia segurança e tranquilidade a quem participava. Dos grandes nomes artísticos, aproveitaram os jovens (Pitty, Paralamas do Sucesso, Detonautas, etc.) e os mais velhos (Sérgio Reis, Morais Moreira, Ivan Lins, João Bosco, etc.). Não demorou muito para Amparo atrair grandes contingentes de pessoas de cidades próximas (às vezes não tão próximas assim) nesta época do ano. O Festival, nas suas 12 primeiras edições, teve notória crescente evolução e inegável sucesso.
Neste ano de 2013, notamos mudanças, não essencialmente mudanças de evolução técnica, mas de caráter político. É claro que elas ocorreriam, isso não era dúvida para ninguém, só não sabíamos como e quantas elas seriam. Essas mudanças não são só motivadas pelo simples motivo de dissociação com a imagem criada pela administração anterior, mas pelo fato que a mentalidade e os princípios que norteiam as duas gestões são naturalmente diferentes, analisando-se já de partida as campanhas eleitorais de 2012. E é especificamente nesta edição do evento que podemos perceber o caráter de “vitrine” da personalidade de seus gestores que o Festival de Amparo tem.
O jornal A Tribuna divulgou a seguinte análise (imagem abaixo) dos gastos do festival:




Todas as informações do artigo podem ser conferidas no site da Prefeitura, no link “Transparência Governamental”).
Vamos então a uma análise complementar, que vá além da questão financeira. No site da Transparência, é possível ver que o processo de contratação das bandas, com as datas que estas ocorreram. Em 2012, a despesa dos principais shows são registradas nas seguintes datas:

Jota Quest: 14/05/2012
Ivan Lins: 24/04/2012
Espetáculo “Amadas”: 09/05/2012
Falamansa: 20/06/2012
Casuarina: 09/05/2012

Já em 2013, as datas dos processos são estas:

Toquinho: 11/06/2013
NX Zero: 11/06/2013
João Bosco e Vinícius: 11/06/2013
Emerson Nogueira: 11/06/2013
Thalles: 11/06/2013

Pela comparação das datas desta pequena amostragem já dá para perceber a diferença. O evento ocorre todo ano no começo de julho (mês 7), e todo mundo que já trabalhou alguma vez com algum tipo de evento desse tipo sabe que um mês antes já é tempo de ter definidas e confirmadas as atrações, assim como já é tempo de ter os materiais de divulgações prontos ou quase prontos para serem distribuídos. Em 2012, vemos que estas atrações principais (escolhidas aqui para demonstração justamente por serem mais complicadas em termos de negociação, mas a lógica serve para as apresentações “menores”, tanto em 2012 quanto em 2013) são fechadas até o começo de maio, tendo como ponto fora da curva o Grupo Falamansa, fechado mais perto do evento, provavelmente por ter tido algum problema pontual nesta questão, coisa que só é possível ser resolvida quando se tem tempo de margem para planejamento e rearranjo para qualquer imprevisto. Em 2013, as atrações foram fechadas faltando 3 semanas para o evento, e, curiosamente, todas no mesmo dia (aliás também é curioso que, retomando a nota do jornal A Tribuna, mesmo uma única empresa fornecendo todos os serviços que 4 empresas forneceram em 2012, teve um orçamento 54% maior para menos dias de festival). Houve negociação, pesquisa de mercado ou foi feito tudo às pressas? É por acaso que o festival deste ano ficou bem mais caro ao município? Olhando por este viés, fica fácil explicar a questão que muitos tiveram do preço da atração “João Bosco e Vinícius”, que custou 167 mil aos cofres públicos, enquanto a mesma atração custou em março deste ano custou 71 mil a menos à Prefeitura de Conchal. Artistas “da moda”, como é o caso da dupla, fazem uma quantidade muito grande de shows por mês e costumam fechar o calendário de shows com muitos meses de antecedência, portanto um show fechado 1 mês antes é um show de última hora, custando assim bem mais caro. O show do Toquinho custou 91 mil à Prefeitura, valor este que seria razoável, se não fosse o fato do show ter durado somente 50 minutos, metade da duração de um show normal “headline” do festival. Nos leva a fazer a simples matemática de que, se tivesse ocorrido no “tempo usual”, o show teria então custado 182 mil, improvável para o artista, mesmo que extremamente conhecido e de valor cultural/musical inquestionável, costuma faturar bem menos que os artistas “da moda” (tomando como exemplo a própria dupla João Bosco e Vinícius). Não se está aqui insinuando que o artista deveria ter ficado mais no palco (provavelmente o show dele é com essa duração mesmo, por própria disposição do artista), mas sim a sensação estranha que causa quando comparamos esta permanência com o valor da apresentação. A apresentação do cantor gospel Thalles custou 65 mil, mas com o tempo da sua permanência usado na sua grande maioria para a pregação, ao culto a céu aberto, em detrimento à apresentação musical, mesmo tendo sido ele apresentado na programação como o “cantor gospel Thalles”. Dado o princípio do Estado laico, é correto que certa religião seja assim tão privilegiada em detrimento das outras? Foi dado o mesmo tratamento as outras crenças?

Saindo um pouco desta questão de despesas, analisemos então a organização estrutural do festival. O Festival deste ano não teve atividades nas segundas e terças (para o estudante nesta época, todo dia da semana é “sábado”, portanto o festival já não cumpre tão bem o papel que antes cumpria de entreter o contingente jovem da cidade, oferecendo lazer e segurança aliados). O Festival deste ano deslocou a praça de alimentação, que além de menor (causou o notório aumento de preços) e mal localizada, acabou matando o deslocamento da concha acústica pros outros palcos (dinamismo anterior do festival, que fazia a população circular pela praça e visitar os palcos, dando público às bandas) e ainda piorou o trânsito dos carros ao redor da praça. Fora a situação perigosa que gerou esse palco tapando a entrada da praça pela rua Comendador (perdendo espaço na praça, que antes era usado no lago) junto com a praça de alimentação ao lado que, em caso de alguma briga, o escoamento de pessoas estava muito ruim, podendo ter voado cadeira em alguém. A própria escolha da atração da dupla de sertanejo universitário já traz esse tipo de insegurança (longe aqui de se fazer uma crítica de gênero musical, mas sim do perigo de perder-se o controle da multidão, que poderia ter transformado a praça em uma “micareta”). Somando tudo isso, temos sorte não ter acontecido algo muito grave (apesar de terem ocorridos brigas e incidentes decorrentes desses fatores). As grades formando um corredor no centro da pista em frente ao palco foram novidades, mas o que adiantou se, em shows pequenos no meio da semana, elas só serviram para distanciar ainda mais o público, dado que não havia equipe da organização que retirasse ou, pelo menos, rearranjasse as grades para que isso não ocorresse. Já no show do João Bosco e Vinícius, a Prefeitura não seguiu a determinação do Corpo de Bombeiros quanto à limitação de pessoas, com 12.500 pessoas a mais que o determinado (Fonte: A Tribuna). Assim não adianta ter grade no meio. Tem também o dinheiro gasto em propaganda dos "feitos" da atual gestão, alguns com erros grotescos de português. Não que minha preocupação seja rigorosamente com a gramática, mas sim com esse gasto desnecessário e que ainda demonstra relaxo. O próprio fato desse uso marqueteiro já é motivo de desgosto. Lembra-se no começo do texto que falava do “efeito vitrine” do caráter gestor municipal que o festival tem? Quer se fazer bonito à custa do nosso dinheiro e ainda faz mal isso.

  
                                         
Por último, o exemplo mais representativo de toda a argumentação do texto: a área VIP. Neste vídeo dá para ver, da forma mais revoltante possível, o funcionamento da área dos “amiguinhos da administração”. Ela funcionou durante todo o festival, tendo sido pedido explicações formais por várias pessoas que se demonstraram indignadas com ter de chegar mais cedo para ocupar um lugar perto do palco, enquanto os “bem relacionados” podiam chegar em cima da hora e estar no melhor lugar em pleno espaço público. Não houve explicação formal, só a promessa (antes do último grande show, do Emerson Nogueira) informal e indireta via Facebook, de que isso não aconteceria novamente, o que acabou não se realizando.
Em resumo: Olhando para toda essa extensa análise em torno de um festival de 19 dias, conseguimos construir um pouco da filosofia e das intenções que a “Mudança Azul” propõe. Estamos discutindo só em base de informações que são encontradas e verificadas factualmente. Dá medo quando pensamos naquilo que nos afeta, mas não vemos. E ainda, estamos vendo só na perspectiva do festival, pintura mais descarada da atual política amparense, mas sabemos que já existem problemas em outras esferas (vide processo do MP sobre improbidade administrativa). O grande ponto: se é isso o que vemos, o que não vemos?